Bahia/SalvadorEntretenimento & Eventos

Balé Folclórico lota TCA com espetáculo afro-brasileiro no dia da Consciência Negra

Um reencontro de ritmos, danças e cores da cultura afro-brasileira aconteceu na manhã deste domingo (20), no Teatro Castro Alves (TCA), com o espetáculo “O Balé Que Você Não Vê”, do Balé Folclórico da Bahia (BFB). Sob o desaguar do céu, a fila que se estendia até o bairro do Garcia sinalizava a busca por um lugar na exibição de arte produzida, estrelada e pautada por pessoas pretas, no dia da celebração da Consciência Negra.

A atração foi uma oportunidade considerada ímpar para a bailarina Daiara Ferreira, 24, que decidiu marcar presença mesmo depois de uma rotina cheia no dia anterior, quando desfilou pelo Afro Fashion Day. “A minha paixão pela dança é o que dá sentido à minha vida. É uma oportunidade de ver arte, de prestigiar, porque a arte salva e cura”, destacou.

Contemplar a dança do BFB foi o que motivou a também bailarina Vivian da Cunha, 34, a estar debaixo de chuva em busca de um ingresso. Capixaba com estadia recente em Salvador, ela comemorou a chance de ver a dança afro no teatro.

“Durante muito tempo nós não éramos vistos, principalmente em lugares de poder, em espaços como a televisão, teatros e balés, porque a cultura branca sempre foi muito fomentada nesses espaços. Nós, pretos, não nos víamos. Então, ver agora o Balé Folclórico com a dança afro é muito importante”, salientou.

Filas para garantir ingresso para o espetáculo chegou ao Garcia (Foto: Arisson Marinho)

Com todos os ingressos vendidos a R$1 (inteira) e R$0,50 (meia-entrada) em razão da iniciativa Domingo no TCA, mais de 1500 pessoas ocuparam a sala principal do TCA. Os portões foram fechados minutos antes do espetáculo, que começou pontualmente às 11h. Dividido em quatro coreografias, “Okan”, de Nildinha Fonseca, foi a primeira dança que deu início ao ato. Personificando o coração, em iorubá, Okan trouxe como foco o papel da mulher negra, responsável por mediar as relações entre os itãs e yabás.

Já a coreografia “2.3.8”, de Slim Mello, trouxe como pano de fundo o cenário das periferias soteropolitanas e a vivência nos subúrbios e guetos de Nova York. A coreografia rompeu os limites geográficos e materiais para criar o elo entre as experiências compartilhadas de pessoas pretas. Com participação em áudio, a cantora Maria Bethânia teceu a linha desse elo através de uma declamação em que acena “abstratamente saudando o infinito”.

Para o diretor geral Vavá Botelho, “O Balé Que Ninguém Vê” veio mesmo com o propósito de mostrar outras possibilidades. “Traz um afro contemporâneo, diferente do folclórico. Esse é o balé que ninguém vê, o da sala de aula, da formação que as pessoas não têm ideia de como funciona até chegar no palco”, explicou.

Em êxtase, a pequena Maia Sacramento, 7, que não parava de dançar na plateia acompanhada de sua colega de escola, rasgou elogios ao que via no palco. “É muito forte, traz uma lembrança muito boa da cidade. [O cenário] parece com o caminho para o trabalho da minha mãe”, disse.

Terapeuta ocupacional e mãe de Maia, Noêmia Cazaes, 46, contou que acordou cedo para trazer as meninas ao teatro. Segundo ela, estar ali era a realização de um sonho. "Já vim em outros espetáculos, mas com ela não. Às vezes, quando tinha apresentação, não tínhamos dinheiro para vir. É muito importante, é uma afirmação para ela se sentir pertencente e também se reconhecer”, frisou.

Na tentativa de aproximar a filha da cultura negra e mostrar a importância da representatividade, Silvio Santos, 38, levou pela primeira vez Maria Helena, 7, ao teatro. “Ela precisa se enxergar e ser vista, então sempre que tem qualquer coisa de cultura negra eu estou tentando levar, para ela já crescer entendendo a importância de ser negra e do que nós representamos dentro do contexto de racismo que existe no nosso país”.

Presente no teatro, a deputada do PSOL, Olívia Santana, apontou a relevância da exibição no dia da Consciência Negra. “Essa data projeta ainda mais essa ideia-força da Consciência Negra. Estar no TCA com um espetáculo de negros feitos por negros é também uma forma de afirmação da nossa vitória cultural”, afirmou Olívia.

Com a exibição da coreografia “Bolero”, de Carlos Santos e revisitação de Vavá Botelho e Zebrinha, que remeteu a obras clássicas, embora com a originalidade dos elementos afro-brasileiros, figuras negras nacionais e internacionais foram homenageadas no telão do cenário.

Por último, a apresentação terminou com “Afixirê”, coreografia reconhecida internacionalmente e criada por Rosângela Silvestre, com participações especiais de bailarinos do Balé Teatro Castro Alves (BTCA) e do elenco do Bando de Teatro Olodum. No fim, uma salva de palmas e um suspiro de encantamento, esperança e resistência.

*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo

Fonte: Correio 24hs

Deixe um comentário